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O mundo está aí para ser descoberto e nós temos todas as ferramentas possíveis para o fazer. Não desistas do teu tempo para descobrir países, cidades, culturas e pessoas impressionantes pelo mundo. Podes até voltar para casa de mãos a abanar, mas voltarás com uma mente a abanar de tantas e boas experiências que viveste. Vê os conselhos da nossa Globetrotter Andreia Castro.

1. O que viajar representa para ti?

Viajar faz parte da minha essência desde muito nova (praticamente desde a minha infância) uma vez que tive a sorte de ter uns pais que sempre me levaram consigo nas suas férias apesar dos custos acrescidos. Com apenas 8 anos de idade já conhecia metade da Europa e cedo comecei a ter experiências “quase a solo” – 15 dias de intercâmbio no Japão aos 13 anos, estudar um ano em Paris durante o Erasmus e um mês de estágio profissional em Londres são alguns exemplos. Por isso, posso dizer que este processo de viajar de forma cada vez mais autónoma foi sendo gradual, ganhando competências e maturidade com o tempo.

A resposta “cliché” é ainda a mais verdadeira de todas: viajo para conhecer o mundo, conhecer os outros, conhecer-me a mim própria. Superar-me. Conquistar-me. Fotografar, escrever sobre isso e deixar um legado para mim e para os meus. Viver a dobrar. Chegar a velhinha e reviver tudo novamente! E aí, ainda conseguir contar as minhas histórias aos filhos, netos ou sobrinhos… Aliada à minha outra paixão (a medicina), tenho condicionado a minha vida profissional nos últimos anos nesse sentido: optei por abdicar de uma posição estável, agarrei na mochila 5 meses, voltei a Portugal para voltar a partir pouco tempo depois. Neste momento regressei agora de 3 meses a trabalhar num navio de cruzeiros pelo desafio e aventura inerentes e, futuramente, pretendo conciliar a minha prática médica com a realização da Consulta de Medicina do Viajante. É uma relação equilibrada em que trabalho e vivo para viajar!

2. Quando e qual foi o destino para onde viajaste sozinha pela primeira vez?

Viajar efetivamente a solo foi algo que me assustou por muito tempo, tinha o típico receio de estar a testemunhar algo de maravilhoso e de me sentir tremendamente sozinha, sem ninguém especial com quem o partilhar. Foi fruto de um acaso que surgiu a minha primeira aventura neste registo. Tinha planeado uma viagem a Marrocos com a minha irmã que não correu tão bem, pelo que antecipei o regresso. Fiquei então entre mãos com 5 dias úteis que precisava mesmo de rentabilizar rapidamente. Já vinha desde há meses a procurar alternativas de viagem e já tinha integrado grupos em agências de aventura, mas nada me deixava verdadeiramente satisfeita. Optei então pela Eslovénia, um país europeu, seguro e com muita paisagem natural. Excusado será dizer que foi das experiências mais libertadoras de sempre… em poucos meses estava a despedir-me do meu trabalho e 5 dias transformaram-se em 5 meses de “backpacking” pelo Hawaii e América do Sul.

3. Como viajar sozinha te enriquece e por quê o fazes?

O conceito implícito a “viajar sozinha” traz uma dualidade que só é conseguida neste tipo de oportunidades. Se é a melhor forma de viajar? Não sei, mas tem muitas características que o tornam especial.

Quem viaja sozinha nunca se encontra só, e creio que em primeiro lugar é necessário termos bem presente esta distinção, sobretudo para quem nunca experimentou. Viajando sozinhos temos oportunidade de nos conhecermos melhor a nós próprios, de tomarmos as nossas próprias decisões, de fazermos tudo ao nosso ritmo. Estamos mais cientes das nossas necessidades, dos nossos desejos, das nossas capacidades e dos nossos defeitos também. Viajar sozinha testa-nos diariamente, e embora a maior parte das escolhas sejam simples (ir para a direita ou para a esquerda? Apanhar um autocarro ou ir de comboio? Que local quero conhecer a seguir?…), a escolha de caminhos menos comuns leva-nos muitas vezes a experiências que implicam a nossa superação física e mental.

Estamos também mais disponíveis em todas as áreas: o ritmo de vida diferente, a imersão numa cultura local e no fundo global expande-nos as ideias, abre-nos espaço para a criatividade condicionada durante tantos anos por um ensino rígido e torna-nos ao final do dia, mais conscientes da nossa posição do mundo e do legado que queremos deixar.

4. Quais são os teus conselhos para organizar uma viagem a solo?

O melhor conselho que posso transmitir será, antes de mais, ir quando se tem a certeza de que esta é uma experiência de enriquecimento pessoal que faz sentido e que se pretende mesmo fazer, mesmo que hajam receios. Aceitar que o medo é normal e que faz parte do processo, é meio caminho andado para encontrar formas de o superar.

Podemos ultrapassar estes receios preparando a viagem da melhor forma possível: uma vez definido o país (ou países) de destino, ter ideia de algumas cidades ou locais a visitar. Esta escolha não tem de ser rígida, porque muita coisa muda “na estrada”, mas permite delinear um plano que inicialmente nos dará algum foco e segurança.

Em relação à bagagem, levar o menor peso possível – hoje em dia é possível comprar de tudo em quase todo o lado. Sou fã dos “packing bags”, sacos de vários tamanhos e/ou cores onde separo a roupa por tipos: isto ajuda-me imenso no dia-a-dia uma vez que não tenho de desfazer a mala para encontrar determinada peça.

Em termos de defesa pessoal, costumo levar comigo gás pimenta, mas a verdade é que vai sempre tão bem guardado na mochila que se fosse necessário não teria como o utilizar!

A internet e as redes sociais são uma vantagem, e a minha experiência com a plataforma couchsurfing não poderia ter sido melhor.

Como médica, não posso deixar de aconselhar em contexto de manutenção de saúde e prevenção de doença a Consulta do Viajante, isto para qualquer viagem mais prolongada ou para países com doenças endémicas.

5. Qual é o destino perfeito para uma globetrotter e por quê?

Esta é uma escolha muito pessoal, mas o meu destino de eleição terá de ser o Chile, que me apaixonou literalmente do princípio ao fim. Este país da América do Sul encantou-me desde as terras frias mas de beleza infinita da Patagónia, até aos campos e florestas luxuriantes, à colorida cidade de Valparaíso, à poluída Santiago ou às areias e lagoas do Deserto do Atacama.

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[2018] Heaven is a place on earth. #dia78 #day78

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Senti-me perfeitamente segura durante toda a viagem, sendo um país muito fácil de percorrer de autocarro (ou, em alguns locais de ferry). Os chilenos são de uma simpatia extrema, sempre prontos para ajudar e com um enorme sorriso nos lábios. A língua também é uma vantagem para quem não se sentir confortável com o inglês, percebendo-se o espanhol chileno perfeitamente.

6. Diz-nos algo que aconteceu numa das tuas viagens que impactou a maneira como viajas.

Ter experimentado o couchsurfing pela primeira vez o ano passado, no Hawaii, mudou em todos os aspetos a minha estadia nestas ilhas, de tal forma que em vez de uma semana acabei por permanecer sete! Há bastante tempo que ouvia falar no conceito, mas tinha os medos óbvios de ficar a dormir em casa de um desconhecido.

Já nem me recordo muito bem por que decidi arriscar, mas após criar o meu perfil e explorar a página solicitei uma estadia de 3 noites em Waikiki, Honolulu. A pessoa em causa não tinha disponibilidade para me receber mas recomendou-me um dos seus grandes amigos… não queria acreditar quando, à porta do hostel (isto porque eu ainda estava naquela situação de “vai-não-vai”), me apareceu um enorme afro-americano da US Navy, com boné e corrente ao melhor estilo hip-hop!

Vê-lo acompanhado de outra rapariga que também iria ficar como couchsurfer deu-me mais confiança e a verdade foi que, quebrando todos os estereótipos (errados!!), foi dos melhores hosts que tive. Este contato abriu-me outros para outras ilhas, e tornaram todas estas estadias totalmente diferentes: em Kauai, o meu host chegou a deixar-me a sua vivenda e carro enquanto visitava os pais durante uns dias; na Big Island ainda me recordo de entrar no jipe e ver uma faca junto ao banco, e pensar em que é que eu me estava a meter… e sim, tive medo, mas esse hóspede e tantas outras pessoas que conheci através dele, depressa se tornou um amigo. Em Maui fiquei em casa de um engenheiro aeroespacial reformado… e nudista, mas de uma cultura e sabedoria impressionantes que tudo o resto se tornava irrelevante.

Porque é que tudo isto foi tão impactante? Porque demonstrou uma vez mais como as pessoas são, na sua grande generalidade, boas e em como podemos confiar nelas! Dormir sobre o mesmo teto de um local, partilhar o dia a dia, ir ao supermercado, cozinhar, sair para um bar sem turistas ou ter uma conversa até de madrugada, deu-me não só uma sensação de familiaridade e paz, como também criou verdadeiros laços que não seriam possíveis caso estivesse a viajar acompanhada, ficado num hostel ou em hotéis. Sim, teria tido outras experiências! Mas não teria estas…

7. Como é percebido em Portugal o facto de uma mulher viajar sozinha?

Creio que há um estigma que já começa a ser ultrapassado, uma vez que cada vez mais mulheres se aventuram a viajar sozinhas. Contudo, sei por experiência própria que esta é uma conquista geracional – nunca se viajou tanto, por tão pouco dinheiro e tão facilmente como agora.

Com 30 anos já estive em mais de 50 países: os meus pais terão começado as suas primeiras viagens por esta altura. Recordo-me bem da insatisfação da minha mãe e avô perante a minha decisão de viajar pela América do Sul durante alguns meses, e creio que resultavam de um misto incompreensão, mas também de receio pela minha integridade física. Já com os meus amigos e até em contexto de trabalho, senti que todos me apoiaram incondicionalmente e que, de certeza forma, eu transportava comigo os seus próprios sonhos.

Genericamente, acho que é entendido como um misto de bravura e audácia, aliado a muita, muita curiosidade (e alguma reserva).

8. O que te motiva a explorar o mundo? Qual foi a experiência mais marcante que já viveste?

Já vivi várias experiências que me marcaram, mas sem dúvida que acordar de madrugada para ver o nascer do sol refletido sobre Las Torres, no Parque Nacional Torres del Paine, foi das experiências mais marcantes a nível físico e mental.

Nessa noite, após 20 quilómetros percorridos, tinha novamente dormido 3 horas, mas desta feita numa tenda desabrigada com temperatura exterior de 5 graus negativos. Por algum motivo (que só pode ser inexperiência), não consegui aquecer-me durante a noite, apesar de todas as camadas de roupa que tinha vestidas. Comecei a caminhar pelas 2:30h da manhã com 7 quilos às costas, entre mochila, saco-cama e máquina fotográfica. Embora tenha começado o percurso com outras pessoas, depressa cada uma se isola tentando não perder o seu próprio ritmo, e de bastões nas mãos e headphones, percorri 11 quilómetros nas 5 horas seguintes. Nessas horas passei por momentos de exaustão emocional em que me debati com várias questões interiores, enquanto caminhava pela escuridão da noite, passando por momentos finais de descrença de que conseguiria chegar à base das Torres antes do amanhecer (e estava tão cansada, que perdi o indicador final e continuei a escalar a montanha quando já não precisava de o fazer). Regressei ao destino seguinte após mais 14 quilómetros, as pernas a pedir descanso e um joelho a acusar dores lancinantes a cada passada por uma lesão provocada noutras aventuras – uma caminhada pela Escócia seguida de uma queda de mota dois meses depois na Croácia (porque eu nem sabia andar de mota). Acho que nunca conseguirei explicar o que passei e senti nessa madrugada.

Igualmente fabuloso, mas pela sensação que emana da paisagem criada, o nascer e pôr do sol sobre os templos de Bagan – desta feita num registo muito mais confortável, em que aluguei uma mota elétrica para percorrer esta terra birmanesa que já teve mais de 10 mil templos budistas.

Outra completamente diferente foi conduzir a costa da Califórnia (de Los Angeles a San Francisco) e o Arizona numa auto-caravana de 9 metros com apenas mais dois amigos, no verdadeiro espirito americano – é das melhores recordações de companheirismo que tenho!

9. Para que tipo(s)/estilo(s) de mulheres a viagem a solo é perfeita?

Uma viagem a solo enquadra-se perfeitamente com personalidades extrovertidas, dinâmicas, sociáveis e curiosas, que queiram explorar e conhecer mais do seu próprio mundo e daquilo que as rodeia. Contudo, acho até muito salutar para alguém mais introvertido, uma vez que se pode manter nesse registo ou, com a ajuda dos outros, crescer noutras direcções.

10. Numa frase, o que dirias para inspirar outra mulher a viajar sozinha?

No final, será sempre mais importante o que fizemos e o que tentámos do que aquilo que deixámos por fazer; ir sem medos e fechar os olhos com a sensação de que vimos e levámos o máximo possível desta aventura que é viver.

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Sobre o autor

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